quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Amargos como a bílis

A energia versátil do homem pós-contemporâneo
Torna inadmissíveis conjecturas de quaisquer lábios
Que canse o homem de correr em circulos
Enquanto as formigas em sua incessante labuta carregam seus fardos

(Jorge)

Quando eu me chamar saudade

A morada da alma se esgota com o chrónos
Criação humana pra delinear os fatos
Muitas vezes escapamos sem saber quem somos
Se esvaindo no alvorecer grisalho

Terei um aprazimento indubitável
Ao evadir de uma máquina tão pútrida e sem sentido
Que neste dia não derramem uma lágrima
Nem murmurem melodias fúnebres aos meus ouvidos

(Jorge)

Zózimo, o homem que soube viver ou Zózimo, um homem justo

Zózimo era homem de poucas palavras
Mas fazia valer cada uma delas
Era sempre o que desse na telha
Sorria na fartura, sorria na miséria

Gostava tanto da vida
Que dizia querer chegar aos cento e dez anos
Brincava falando sério
Falava sério brincando

Era um homem que não se escondia num canto
Fazia de cada momento um pedaço inesquecível
Diziam as más línguas que Zózimo não tinha juízo
Queriam mesmo era como Zózimo ter vivido

Gastou seus últimos tostões na quimera
De deixar para os seus filhos um mundo melhor
Pois assim se sentia: pai do mundo
E agora sem Zózimo, o mundo é um mundo pior

Na sua lápide havia poucas palavras
Mas simples como Zózimo, tudo diziam
“Aqui jaz um grande homem,
Que soube viver com alegria”

(Jorge)

Versos de Azaléia (alegria de amar)

Se tudo posso
Em ti repouso
Num suave pouso
Tenho o meu corpo
A se entregar
Durmo sobre teus seios
Será mais um devaneio,
Que me trouxe o luar?

A alvorada me revela
As belezas da primavera
E entre elas, vejo você
Não! Graças a Deus não era um sonho
Acordei em teus braços
E pude enfim perceber
Que são os teus abraços
Que pro resto da vida
Irei de querer...

Sinto o teu cheiro
Tomar-me as entranhas
E é-me extasiante
A sensação de delírio
Quando me inebrio
Com a tua mais bela forma
Áurea, incorpórea, transcendental

Magnífica é a tua doce formosura
E de onde é oriunda,
Tão sublime criatura,
Se não for das mãos de Deus?

Me aceita
Como o teu mais novo aliado
E juro por tudo que me é sagrado
Que não irás se arrepender

(Jorge)

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

A pedra filosofal

A força motriz que me propulsiona ao éden
É renegada pela força tirana das bocas moralistas
Me recuso a pensar que a verdade é obtida
Se esquivando dos maiores prazeres da vida

Tenho o elixir para insensibilidade de cérebros moribundos
Minha eloquência, pura loucura razoável
Sou uma espécie em ininterrupto conflito
Um ser extremamente sorumbático

Seria prodigiosa uma mudança abrupta de comportamento
Ou uma mera tolice de cunho hipócrita
Abdicar aquilo que me traz contentamento
Sem a mínima perspectiva de melhora

(Jorge)

Pose

Vejo edifícios coloridos
Escondendo os rostos cada vez mais tristes
São concretos sobre concretos
Que decerto não preenchem o vazio de suas almas
Nas vias eu vejo máquinas
Transitando suas carcaças bem vestidas
Falso é o júbilo que aparentam
Os verdadeiros escravos de coisas inanimadas

Quão morta é a vida desta gente que se acha
Merecedoras do cetro do poder mundano
Enfeitadas como uma árvore de natal
Não compreendem tamanho desengano
E quão néscia é a tradição destes falsos moralistas
Que enxergam a plebe como almas sujas
Viram o ano vestidos de branco
Escondendo o ódio no bolso da blusa

Com uma excessiva insatisfação compreendi
Que a vida passou a ser uma mera jogada
Tostões, patrimônios, situações definidas
Um eterno baile de máscaras
Por isso espero não permanecer aqui
Diante de tanta falsidade
Vendo o homem ficando cada vez mais podre
Se tornando cada vez mais carne

(Jorge)

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Devir

Se no seu peito brada um coração faminto
Na inquietude do misto ódio e amor
Se o seu corpo balança, estremece, acorda e adormece
Na dança inebriada que fulgura a própria vida
Se a sua alma vaga no intrínseco labirinto do seu ser
Verte suas lágrimas de emoção
E grita aos quatro cantos do mundo
Com o regozijo de quem tem o poder dos camaleões
Grita, depois fica mudo
Veste-se, depois fica desnudo
Que a Terra gira
Que a chuva vem e vai a todo instante
Que o Nilo é tão belo sendo a cada milésimo de segundo outro
Pois os rios correm e nunca são os mesmos

(Jorge Rêgo)

Amanhã

O amanhã está chegando
E vai ser a hora de traçar um novo plano
Cortar o cabelo
Fazer a barba
Sair de casa
Procurar um emprego
Ou sentar na velha cadeira da sala
E fazer as poesias que ainda não foram feitas
Amanhã é dia de andar, correr, mudar...
Mudar de rumo, de vida, de lugar
Amanha é o grande dia
Hoje não...

(Jorge)

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

O pacto

Eu ainda era mui pequenino
Quando me atiraram numa vala imunda e fedida
Zombaram do meu corpo nu, e depois gritaram:
- Lar, doce lar, bem vindo à vida!

Bastardo que sou, compreendi logo as manhas deste jogo insalubre
Cresci com os dois pés atrás e um olho nas costas
Tentaram me civilizar, chamaram-me de bárbaro
Já me tinham como a ínfima natureza morta

Fui conduzido a uma espécie de Termas de Trajano
Onde a água límpida brotava de uma fonte caudalosa
Mas por detrás desta aparente estadia havia o inferno
E vi o próprio satanás me tentar com as promessas mais prodigiosas

Resolvi aceitar o tal catecismo
Minha alma vagou nas cavernas insólitas, fui ao abismo profundo
Desde então tenho me deparado com a estranha sensação
De que não pertenço mais a este mundo

(Jorge)

Que coisa? Que coisa?

Quero ser uma planta, ou talvez não...
Pensar se tornou meu infortúnio diário
Nego-me a cada espaço de tempo, por menor que seja...
Depois procedo de forma contrária
Navego de um pólo a outro
Com a orientação de uma agulha magnética quebrada
Sigo os mapas das estrelas
Que mais uma vez, não me dizem nada
Se não há nexo no que digo
Talvez eu queira dizer-lhes outra coisa
Que coisa? Que coisa?
Por vezes se diz muito mais nas poesias insossas

(Jorge)

sexta-feira, 26 de junho de 2009

O devir da Grande Mãe

Cá estou eu, inebriado nas palavras eloqüentes
Cá eu estou terrivelmente duvidoso do que sou
Vejo-me de baixo para cima e vice-versa
Completamente incerto dos frutos que darei
Contemplo-me como uma árvore entre tantas outras
Tenho vida, cores e até mesmo raízes
Mas também, tenho polegares, e unhas neles
Assemelho-me com a massiva forma da minha espécie
Mas ora! Também pudera...
Que forma queria ter eu?

A certeza humana é a soberana incerteza
Ah, meus caros...
Que prazer eu tenho em saber que isto ocorre
E minha satisfação é contemplar estas coisas
Gozar ao ver a chuva no céu de Brigadeiro
Não ficar estarrecido com as mudanças repentinas da nossa Grande Mãe
Compreender que todo este devir é necessário...
Então que surjam novas formas
Que surja um novo mundo!

(Jorge)

quinta-feira, 30 de abril de 2009

A eclesiástica falcatrua

Sou bastardo de um mundo epiléptico
Inundado por algozes tiranos
Onde a cruz é um instrumento de tortura
E os libertinos se tornam santos

Não regozijarei aos quatro cantos
A eclesiástica falcatrua dos porcos na lama
Até as vestes da maior das putas
É considerada mais sacrossanta

Pensemos de mente totalmente aberta
Sobre os adulterados dogmas destes calculistas
Que incineraram corpos cândidos
Com fantasiosas sentenças de heresias

(Jorge)

domingo, 29 de março de 2009

A plena razão de Heráclito

A ameaça da discórdia entre os planos
Torna inimaginável um futuro pacífico
Procuro no fusco dos olhos da menina taciturna
A quantidade de adrenalina pra um só coração
Avisto uma luz no fim do túnel
Talvez a radiação luminosa provinda
De uma fonte particular como a vela
Ou talvez seja a luz que carrega
O segredo da escuridão

Procuro as meias como um velho ranzinza
Que tateia as cômodas por não ter visão
E vejo que o quociente obtido nesta conta perturbadora
É tão cruel quanto o produto da multiplicação

Agora subtraio os opostos em questão
E embora eu não encontre resultado conclusivo
Deixo a dualidade ser uma
Deixo o uno ser dual
Deixo tudo como está
E deixo para Heráclito a plena razão

(Jorge)

quarta-feira, 25 de março de 2009

Mundo Nefasto

Já me indaguei de coração aberto
Se realmente sou um ser pusilânime
Creio ser uma informação inverossímil
Continuo querendo a vida sob meus ditames

Não é fria a forma como tenho me comportado
É que tenho passado por estranhas sensações
E como mecanismo inconsciente de defesa
Escondo-me como ratos em porões

Não acredito em mudanças do meu pobre estado
Habitando este intolerável mundo nefasto
Corrompido por vermes de um falso jardim

Não acredito na proeza de uma melhoria
Me encontro submerso no mar da melancolia
Já se foram todos os serafins

(Jorge)

segunda-feira, 2 de março de 2009

A guerra

Campos de lutas são mares revoltos
Convulsões repentinas por bandeiras coloridas
Fagulhas de ódio repicam em corpos nervosos
Corações batendo com chagas bem vivas

Armados com cólera desenfreada
Patentes descuidadas desmarcadas por estrelas
Sem brilho, sem cor, sem alma
Esperam a morte ou o fim da peleja

(Jorge)

Vem ao mundo, imundo

Vem ao mundo, imundo
Carregar seu corpo
Vagar sem rumo
Será apenas mais um vagabundo

Perca a esperança
Nada te espera
Desiste enquanto há tempo, pequeno
O futuro já era

Não vale o tempo que se perde
Não queira conhecer a fome
Nem herdar o pobre nome
De um outro João Ninguém

Pega o cordão que te prende, começo de quase nada
Coloca-o em volta do pescoço, quando estiver formado
E o sofrimento vindouro
Não terá a menor chance de mostrar sua cara

Joga fora o lixo que se chama vida
Ou vem ao mundo que não te espera
Vem comer o pão que o diabo amassou
Pois teu futuro já era

(Jorge)

Tempo dos Facínoras

Loucos, calabouços, quimeras...
Vermes insabidos, o tempo dos loucos já era ?
O calor e o frio são apenas um...
O tempo de ontem e o de hoje, é o tempo das feras.

Espera que te chamem sábio
É apenas mais um dentre tantos insanos
Entra ano e sai ano, meu caro
E ainda há de ouvir diversos disparos..

Mistura sua laia, forja um, dois, três doidivanas...
Há um preço pela audácia
Pensa que fez um belo trabalho, Diabo
Construiu mais umas pragas.

Vem ao mundo nú, chora que é sinal de boa saúde
Enverga-te ao homem de estola
Espera a água cair lentamente em tua cabeça, miúdo
Prepara o teu pescoço pra degola

(Jorge)

Mais um dia infeliz ?

Não quero ver o sol nascer, tão cedo
As trevas noturnas me trazem paz
Vou pedir ao sol que espere um pouco, um pouco mais
Que me deixe contar todas as estrelas
Antes de raiar mais um dia infeliz
Vou me perder nas contas
Fazer de conta que me perdi
Assim enganarei o sol
Da mesma forma que o mundo nos engana
Dizendo que um dia ensolarado é um dia feliz

(Jorge)

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

O grito taciturno do homem vegetal

O silêncio na mesa
Molesta excessivamente meus ouvidos
Sinto uma dor veemente e profunda
Paro, penso, grito!

Grito um grito mudo
Mas grito tudo
Grito tudo que está preso
Na minha garganta inútil

Durmo um sono profundo
O sono de uma estátua
Que não dorme nunca
Que nunca está acordada

(Jorge)

Antigo amor

Da tua face não me lembro muito
Me recordo dos traços de felicidade
Quando seus olhos fitavam os meus
No meu rosto o seu beijo ainda está marcado
Como brasa que distingue bois
E embora nesta minha pobre pele
Tantas senhoras tenham tocado
Ainda posso reconhecer com certa facilidade
Que o cheiro ainda é o seu

(Jorge)

O passado não volta mais

Minha vida sem graça
Ainda menina, linda
Desgraça!
Minhas manifestações mentecaptas
Minhas culpas, desculpas
Uma multa por avançar o sinal
Minha vasta ignorância
Ainda que eu seja uma criança velha
Ainda que eu leia jornal
Minha doce ilusão
Esperança, afável lembraça
Vejo, desejo
Espero, me desespero
E o passado não volta mais!

(Jorge)

Únicos e perdidos

Parte I

De que nome posso chamar o sol?
Sol mesmo?
Desculpe, não conheço o ventre de onde veio
É um mamífero, ou o que será?
Como ele se reproduzirá?

Sol que ilumina grande cenário de dementes
Pouco conheço sobre ti
Sei que és único
Assim como cada rosa
Entre tantas num imenso jardim
Assim como cada homem que habita o planeta
Como cada gota de água
Que cai nos dias de chuva
Como cada nuvem no céu
Cada rabisco no mesmo papel

Sessenta anos é um bom tempo pra se apegar a este lugar
E no fim todos terminam viajando sem malas
Não querem saber se você está pronto
Talvez você já esteja pronto

Parte II

Cada um mergulhou numa triste ilusão
As ostras sofrem para dar pérolas
Assim como as feitas pela costela de Adão
E pérolas valem mais que bebês?
Não se sabe para onde o vento vai
A qualquer instante ele muda de direção
Exatamente como nós
O vento talvez tenha se perdido também
As águas estão furiosas com tanta perturbação
A espera de um comando
As promessas serão quebradas?
E quem irá escrever com um lápis sem ponta?
E quando a morte chegar?
Será mais uma decepção?
Então espere só mais um pouco
Aprenda esperar mais um pouco
Que tantos segredos irão se revelar

Hora de partir

Lembro do velho correndo
Correndo como quem corre de medo
Sabe o velho que se aproxima o tempo
Do livramento do cativeiro

Cai uma lágrima
Lágrima de desespero
Mas logo surge o sorriso
De quem viveu por inteiro

(Jorge)

Seu Pergunta

Nada é tão exato
Seu Pergunta sabe disso
Quando olha para os ponteiros
Sente dor e muito medo
De correr todo esse risco
Seu Pergunta está confuso
Seu Pergunta quer respostas
Uma boa explicação...
Pergunta a todo mundo
Pois nada sabe sobre o mundo
E todo mundo explica
Mas Seu Pergunta se complica
E explica, que tudo se complica
No ponto de interrogação

(Jorge)

Desprezível

Desprezível é a vida mal vivida
Que se consome com o tempo
No mesmo chão de todo dia
Desprezível é acreditar que a eternidade da alma
É crença, supertição, pura ilusão
É pensar que o prêmio de toda uma vida
É a estadia eterna em um belo caixão
Desprezível é o pensamento em vão
É o medo de tentar, de fracassar
De consumir-se pelo fogo das paixões
Desprezível é não ocupar-se com nada
Ou ainda pior
Ocupar-se com aquilo que não merece ocupação
Desprezível é a mentira
É o prazer de ser cruel sem escopo
A infidelidade da alma com o mundo
Ser pérfido por própria natureza
Desprezível é não conceder o perdão
A quem a vida já castigou
E mais desprezível ainda
É não ter amor no coração.

(Jorge)

Correndo atrás do vento

Quero alegria
Mas não preciso de um jardim
Uma flor, uma rosa
Isso é o bastante para mim
Um simples "oi" da mulher amada
E me perco num copo de bebida
Já não sei o motivo de tanta tristeza
Se posso ver o sol nascer
Não quero mais lutar pra sobreviver
E continuar a ver que tudo é em vão
Chega de correr atrás do vento
E esperar que o tempo
Faça de mim apenas uma vaga lembrança

(Jorge)

Passatempo

Se insisto, sigo em frente, vou a luta
Não sinto a culpa do fracasso
Me sinto na busca da fábula
Mais sensata, mais exata
Que me deixe viver em paz o tempo inteiro
O tempo inteiro, que inteiro, é passatempo
Tempo que não passa quando quero que passe
Tempo que passa quando passar não interessa mais
E não existe pressa que não possa esperar

(Jorge)

Ser o que é

Porquê tanto medo de ser assim
Assim tão quieto, tão calado
Como um tronco morto, tão vivo...
Com vergonha de não ser como o irmão mais velho
Que é tudo o que um pai sonhou
Será que não é digno ser como uma pedra ?

(Jorge)

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Interminável dia de Domingo

Passeio por toda a televisão
Olho da minha janela os carros passando
A moça de preto, de luto, aos prantos
Sinto medo do que conheço
Muito mais medo do que não sinto
Um frio repentinamente me toma o peito
E meu único desejo é o de ser engolido
Ouço barulho lá fora
Barulho do vento soprando
Avisando que o interminável dia de Domingo
Aos poucos vai se acabando

(Jorge)

Liberdade

O pássaro que vi morreu
Não com um tiro de espingarda
Ou com uma badogada certeira
Morreu cercado
Cercado de água
De comida
De grades
O pássaro que vi morreu isolado
Morreu de tristeza
Morreu de prisão

(Jorge)

Sentidos

Minha bruta visão
Não precisa ser lapidada
Pra que eu enxergue este mundo
Mundo de quase nada

Meu insensível olfato
Não precisa ser melhorado
Pra que eu sinta o cheiro das rosas
De um jardim já acabado

Minha perdida audição
Não precisa ser encontrada
Pra que eu ouça os gemidos
De uma humanidade tão desgraçada

Meu pobre paladar
Não precisa ser mais apurado
Pra que eu sinta o gosto terrível
De lábios envenenados

Meu desgastado tato
Não precisa ser mais refinado
Pra que eu sinta gélidos corpos
De corações paralizados.

(Jorge)

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009